Mais de duas décadas depois de ter retirado sua representação
diplomática do território iraquiano, no início da Guerra do Golfo, em
1991, o Itamaraty voltou neste mês a ter uma embaixada em Bagdá. O
embaixador Ánuar Nahes mudou-se em 1º de março para o composto onde
funciona a representação brasileira, no bairro de Al Harthia, e começou a
trabalhar para fortalecer as relações diplomáticas entre os dois
países.
Em entrevista ao G1, por telefone, Nahes explicou que a
recém-inaugurada embaixada ainda está em fase de instalação, e que as
primeiras duas semanas que passou em Bagdá foram marcadas por um
trabalho básico de conhecer as pessoas do governo e os empresários do
país.
Aos 59 anos e com três décadas de carreira diplomática, o embaixador
disse que a principal preocupação do Ministério das Relações Exteriores
ainda é com a segurança dos diplomatas e funcionários que trabalham com
ele. A embaixada em Bagdá tem outros três funcionários do Itamaraty, mas
a equipe pode chegar a sete.
Segundo Nahes além de preocupar, os cuidados com a segurança limitam a
circulação pela cidade dificultam o trabalho.“Desloco-me pouco pela
cidade, indo apenas a compromissos oficiais. Temos uma equipe de
segurança que minimiza os riscos que corremos. Deslocamentos são
perigosos e devem ser programados. Há o perigo dos carros-bomba nos
'check points'. Não posso dar bobeira na rua, sem segurança, pois há o
perigo de sequestros", explicou o embaixador.
"Estamos instalando tudo do zero, começando a montar nossa estrutura.
Apresentei as credenciais ao ministro da Relações Exteriores, mas ainda
não ao presidente iraquiano”, disse.
Nesta terça-feira (20), uma série de atentados deixou dezenas de mortos em Bagdá e em outras cidades iraquianas.
Segundo ele, ainda não foi possível coletar informações detalhadas
sobre brasileiros que vivem no Iraque. Um relatório do Itamaraty sobre
cidadãos do país no exterior diz que 15 brasileiros vivem no Iraque.
"Tenho notícia de uma família brasileira no Curdistão [no norte do país]
e de outra em Bagdá, mas são funcionários da antiga embaixada que têm
cidadania brasileira. Além disso, há o Zico, que está treinando a
seleção iraquiana de futebol e passa temporadas no Curdistão e outras na
Jordânia."
Relações promissoras
Nahes explicou que o Brasil, mesmo sem ter uma embaixada "residente" em
Bagdá por 21 anos, nunca chegou a cortar relações com o Iraque. Por
conta da guerra travada após a invasão do Kuwait pelo regime de Saddam
Hussein, no início da década de 1990, a representação brasileira para o
país ficou acumulada com a embaixada em Amã, na Jordânia, mesmo que
fosse indicado um embaixador voltado ao Iraque. A volta da embaixada
ocorreu apenas três meses após a retirada oficial das tropas
norte-americanas do território do Iraque, em dezembro.
Apesar de ter se tornado um nome associado a confrontos, o Iraque
“promete”, segundo Nahes, e os iraquianos têm muito interesse no
Brasil. “O Iraque deve retomar um lugar importante entre os países
árabes. Temos que apostar nesse futuro e estamos preparando o terreno
para uma maior proximidade entre o Brasil e o Iraque”, disse Nahes.
Segundo o embaixador, as áreas de economia e política são as mais
importantes nessa relação. “A economia se impõe. As pessoas aqui têm
muito interesse no Brasil. Há empresários querendo ir ao país, fazer
negócios. E há interesse de empresários brasileiros em fazer negócios
com o Iraque”, contou.
Um dos primeiros passos, segundo ele, é negociar acordos jurídicos para
as relações entre os dois países e o comércio entre eles. “Foram 21
anos afastados, e precisamos recriar toda a relação. Diplomacia é um
contato entre estados, e é um trabalho de longo prazo. Medidas tomadas
hoje podem só ter efeito daqui a muitos anos”, disse.
Violência
Apesar de ainda ter problemas com violência, o embaixador alega que o
país está sendo pacificado pouco a pouco, e que a situação é melhor de
que era em 2006 e 2007, mas ainda há risco, especialmente de sequestro.
Para tentar proteger a equipe, a embaixada fica num composto protegido
no bairro de Al Harthia, "uma região boa da cidade". São dois imóveis
que incluem residências e chancelaria, tudo protegido por muros duplos
de concreto e arame.
"Ainda há violência, mas são boas as perspectivas”, disse. O mais
importante, segundo ele, é que mesmo ficando confinado na embaixada a
maior parte do tempo, “lá fora a vida continua normalmente”, diz,
destacando que há vida nas ruas, e famílias vão aos parques da cidade.
Além do embaixador há pelo menos mais três brasileiros envolvidos no
processo. Eles vivem em regime comparável ao de "embarcados", ficando um
tempo em Bagdá trabalhando direto e tirando um outro período de folga
fora do Iraque. "Ainda estamos definindo o esquema. Talvez seja de
ficarmos 40 dias aqui e depois 10 fora. ainda estamos testando nossa
resistência", disse. Próximo de sua aposentadoria, Nahes diz que tenta
viajar ao Brasil a cada período fora do Iraque. " É uma forma de começar
a voltar pra casa, após uma vida vagueando pelo mundo."
Segundo o embaixador, apesar da violência que ainda existe, o Iraque
está aberto a visitantes. "Há muito desconhecimento sobre o Iraque, e
muito interesse em conhecê-lo", disse. Além disso, o país está começando
a melhorar sua situação e a se tornar muito atraente ao comércio
internacional, o que leva empresários a conhecerem o país. Nahes alegou,
entretanto, não poder recomendar uma ida ao país. "Não posso dizer
'venham' ou 'não venham'. O que posso é descrever a realidade que existe
aqui hoje. Há risco, há violência, mas a vida segue.”
Fonte www.g1.globo.com
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